Por Jonatas Leandro*
Imagem: Freepik |
Não é preciso ser um entusiasta ou um profissional de tecnologia para já não ter se deparado com o termo inteligência artificial (IA). Ela está presente no nosso dia a dia, a cada transação bancária, ou na oferta de produtos e conteúdos nas nossas redes sociais. Contudo, o lançamento do ChatGPT, plataforma da Open AI divulgada em novembro de 2022, trouxe um novo elemento de disrupção para a humanidade. Estaria eu exagerando? Venha comigo.
Comparativos e metáforas podem auxiliar a entender o tamanho do momento tecnológico que vivemos. Como bem lembrou em sua palestra na Febraban Tech 2023 o meu colega Ignasi Barri Vilardell, Head de Portfólio de Ofertas, Desenvolvimento de Negócios para IA e Nuvem, e Responsável pelas Estratégias de Fusões da GFT Espanha, há quase 2 mil anos o Homo Erectus – primeira espécie humana com proporções modernas do corpo, de braços curtos e pernas mais longas – descobriu que a fricção entre duas pedras gerava uma faísca que, se aproximada a algo de fácil combustão, geraria uma chama: o fogo.
Tal medida evolutiva abriu-lhe uma gama de possibilidades (se defender de animais selvagens, cozinhar, se aquecer no inverno, etc.), sem ter a exata ideia de que algo tão simples, em princípio, abriria um rol de possibilidades como, por exemplo, a Revolução Industrial, no século 18. Como você já deve estar imaginando, teria a IA para o homem moderno o mesmo impacto revolucionário do que o fogo foi em outros tempos? Sim e te mostro o porquê.
A base da IA remonta os anos 1940, com as descobertas do matemático britânico Alan Turing, com evoluções gradativas nas décadas seguintes. O uso de grandes bases de dados teve papel preponderante a cada avanço. É o que faz o ChatGPT e seus concorrentes produzirem uma série de soluções personalizadas. É também o que permitiu, lá em 1996, que um supercomputador da IBM, o Deep Blue, derrotasse o enxadrista Garry Kasparov, algo cercado de ceticismo à época.
O que une a história, passado, presente e futuro, envolve o ânimo gerado pela tecnologia que se aprofunda e cria facilidades de um lado, perante os temores sobre os malefícios que tal ferramenta pode causar às pessoas se for utilizada de maneira incorreta. Com o fogo foi assim, por que não seria com a IA? Entretanto, tudo está definido e claro sobre para onde vamos com essa inteligência artificial que participa cada vez das nossas vidas? Vamos com calma aqui.
Toda vez que há uma grande descoberta a animação da sociedade é ampla, com a crença de que tudo irá mudar. Todavia, a velocidade da alteração da realidade mundana não se dá na mesma proporção das expectativas das pessoas. Não que essa disfuncionalidade entre expectativa e realidade deva nos fazer subestimar a tecnologia a longo prazo. Isto é o que geralmente acontece, mas há bons exemplos de que, com a IA, a história foi, é e será bem diferente de qualquer outra tecnologia. Falar disso me permite diferenciar dois conceitos importantes sobre o tema, no que tange a IA Generativa, muito em voga nos debates da atualidade, e na IA que se classifica como Predicativa.
Os serviços financeiros, como aqueles já vistos com o Open Banking e outros aderentes ao Open Finance, estão na dianteira quando falamos no uso da IA Generativa, aquela com capacidade de criar novas informações a partir de uma base de dados pré-existente. É assim que bancos e fintechs estão oferecendo serviços e ofertas personalizadas a cada cliente, com extração e tabulação de dados de maneira automatizada. E não para por aí.
Iniciativas no setor automotivo (de inspeções veiculares a carros autônomos), de saúde (telemedicina para diagnósticos automatizados e velozes), e de manufatura (uma produção de assentos de alumínio já cai de sete minutos para alguns segundos na Alemanha) são outros exemplos daquilo que a IA já entrega de fato, e só estamos começando a explorar o real potencial disso. Aqui entra o que já começa a ser chamado de IA Predicativa.
Se classifica algo como predicativo quando se atribui uma qualidade e/ou uma característica a algo. No caso da inteligência artificial, significa ir além dos dados gerados ante uma cadeia imensa de informações e lhe atribuir qualidades e características, partindo de modelos e arquiteturas profundas e de alto desempenho. Novos modelos de hardware e software já estão entre nós e outros virão dentro desse raciocínio, que tem também a democratização do acesso às informações e a industrialização de soluções que se expandem para diversas áreas como figuras centrais.
Por ora, a ideia generativa da IA faz com que as maiores empresas do planeta – Google, Microsoft, Meta, Amazon, entre outras – corram atrás dos seus próprios modelos à lá ChatGPT. Em comum em cada uma dessas iniciativas, além da produção de textos, imagens, vídeos e outros conteúdos, está o potencial de finitude incerta, sobretudo pelo scraping mais profundo e de valor agregado em ascensão. Com menos esforço manual, estamos mais e mais melhorando a qualidade de dados e a eficiência de todas as aplicações possíveis.
É nítido, desta maneira, que a escalabilidade é atrativa demais para ser ignorada no mundo dos negócios, impactando a vida de trabalhadores, consumidores e da sociedade em geral. Possivelmente, o grande desafio colocado pela IA, seja ela generativa, predicativa ou de outra ordem, está no seu elemento ainda estático, que mais se baseia em gerar novos dados a partir de uma base pré-concebida de informações. Há, porém, a tendência de que isso não perdure por muito tempo – o Bard, do Google, não nos deixa mentir.
As regras deste jogo envolvendo a IA passa por isso: ter plataformas e ferramentas cada vez mais baseadas em modelos de linguagem naturais, criando novas cadeias de valor e, consequentemente, de dados. Isso será fantástico, porém há sempre o “mas”. Tudo isso precisa vir sempre acompanhado de três premissas fundamentais: sistemas seguros e relevantes; custos reduzidos (hoje treinar com IA é caro); e privacidade de dados, sem modelos estereotipados e manipulados.
Volto à pergunta que fiz no começo deste artigo: estaria eu exagerado? Não. A inteligência artificial é agora, e isso nos coloca dois caminhos centrais como humanidade: vamos reagir rapidamente e capitalizar com esses e outros fenômenos relacionados, ou iremos apenas enfrentar as consequências por estarmos atrasados perante a evolução tecnológica? Esta é uma resposta que nem o ChatGPT ou algum algoritmo pode gerar para nós.
*Jonatas Leandro é VP de Inovação da GFT Technologies no Brasil
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